quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Meio Ambiente, Código Florestal e as Tragédias Ambientais

Antes de comentar sobre a intenção de políticos, quando propõem um novo instrumento legal para o gerenciamento dos recursos naturais, inclusive ocupação e uso do solo, precisamos entender a proposta do vigente Código Florestal.

O Código Florestal foi estabelecido em 1965 e dentre vários pontos técnicos considerados, prevê a preservação de áreas naturais, conservação dos recursos naturais naquela época, em que o Brasil iniciava a intensificação da exploração de terras e florestas. Este código já sofreu algumas alterações ao longo destes 45 anos de sua existência.

Nessa perspectiva o Código Floresta estabelece, pois temas fundamentais: as áreas de preservação permanente (APP) e as áreas de reserva legal (RL).

De acordo com este Código, são APP as áreas que protegem a existência de qualquer forma de água no terreno, encostas e picos de morros e montanhas, além de áreas passiveis de riscos. Já reconhecendo a exploração das terras e florestas que estavam por vir, foram estabelecidas as RL, justamente para garantir a conservação dos recursos (valores) naturais especiais de cada ambiente e que o seu tamanho varia em função dos ecossistemas e regiões onde se localizam as propriedades.

Nos últimos anos, mesmo com a intenção de intensificar o registro destas áreas de RL pelo governo nacional, infelizmente os resultados obtidos estiveram muito longe do esperado.

De fato, o Código Florestal não distingue áreas urbanas de áreas rurais, pois considera, e está correto em fazê-lo, que todas as áreas utilizadas pelo homem têm a mesma origem. Entretanto, é preciso rever as atuais condições ambientais nacionais, pois nossas coberturas vegetais, ecossistemas, recursos naturais e necessidades humanas são completamente diferentes das existentes em 1965.

Especificamente ao que tenho observado como intenção de alguns políticos, e com todo respeito ao Valdir Colatto e a outros tantos políticos que tanto fizeram por seus municípios e regiões, e que tentam arduamente alterar o código florestal, preciso chamar a atenção para alguns pontos em seus discursos e proposta de Lei.

De fato o Código Florestal data de 1965 e apresenta-se atrasado para alguns aspectos técnicos e por isso requer revisão técnica e principalmente científica urgente, e desculpa, não somente política e empresarial.

Há outro erro, quando o Colatto em entrevista ao Jornal Folha Regional de Xanxerê, SC diz que a aplicação do Código Florestal não evitou as tragédias. O problema é exatamente este: o código não foi e nem é respeitado, nem nas áreas urbanas e muito menos nas rurais, pois o governo permite que a população utilize áreas que deveriam ser preservadas; além de que o atual sistema de uso do solo altera o curso dos rios, sem nenhuma consideração aos registros históricos de maior e menor vazão dos mesmos, que deveriam ser considerados para a ordenação territorial, estabelecimento das margens de preservação, zoneamento econômico ecológico (ZEE) para uso do solo.

Assim, posso dizer que as tragédias aconteceram, por que exatamente o código não foi aplicado e nem respeitado, permitindo edificações às margens de rios e nas encostas de morros e montanhas (áreas de instabilidade geológica).

Concordo que precisamos de novas Leis de Ordenamento Territorial, ocupação e uso do solo, mas temo que a atual proposta do Novo Código Ambiental coordenada pelo Colatto, não considere aspectos fundamentais à preservação e conservação da natureza e muito menos à vida humana, pois esta levando em consideração questões econômicas e políticas acima das ambientais e naturais.

O Colatto poderia promover e buscar recursos para a organização de eventos científicos para tratar e discutir o tema, gerar diretrizes que depois de feitos, sirvam para determinar as bases de pesquisas científicas e assim obter resultados efetivos a todos os interesses e necessidades. Somente com parcerias técnicas, cientificas, econômicas, políticas e ambientais é que poderemos solucionar este assunto.

Assim, não tenho medo em afirmar que esta tragédia é consequência sim, da omissão do governo, do desrespeito ao meio ambiente e ao ser humano.

Não só o Governo do Rio de Janeiro, ou não usou, ou usou para outras atividades o recurso que deveria ter sido utilizado para evitar tal tragédia, mas também outros governos brasileiros não o fizeram.

São mais de 750 mortes já confirmadas, ainda há centenas de corpos desaparecidos e são milhares de pessoas desabrigadas, não só no RJ, mas também em vários outros estados brasileiros, inclusive SC.

Também ainda há muitos desabrigados das enchentes de novembro de 2008 aqui em SC.

Simplesmente comprovando que se o Governo realmente tivesse interesse isso tudo já poderia estar sendo resolvido.

E uma das atitudes, a mais importante é a aplicação do código florestal, no que versa sobre áreas de risco e de instabilidade física e geológica.

Colatto também levanta um ponto fundamental, Meio Ambiente e Florestas são diferentes.

As florestas fazem parte do conceito de Meio Ambiente, um Meio ambiente pode ser formado por florestas, campos, savanas, rios, mares, oceanos, atmosfera, pois cada uma destas formações é considerada como sendo recursos ambientais, que geram benefícios ao Homem e aos Animais (alguns pesquisadores consideram o Homem e os animais como componentes do Meio Ambiente).

Entretanto, quando falamos da área econômica florestal, devemos entender a atividade florestal da mesma maneira que compreendemos uma indústria: utilizando um espaço físico ambiental, e, portanto, sujeita às Leis Ambientais.

É preciso uma revisão completa sobre o tema, mas ela deve ser desprovida de interesses políticos, econômicos e empresariais, considerando o Homem em seu desenvolvimento e sustentabilidade, e a Natureza em seus valores e recursos capazes de não só gerar o desenvolvimento, mas também garantir a sustentabilidade humana.

Pois, caso contrário, continuaremos vivenciando tragédias e perdas de vida como as atuais e mesmo com investimentos para o controle destes eventos ambientais, não estaremos tratando das suas causas.

2 comentários:

Régis Camargo disse...

Tenho acompanhado toda essa discussão sobre os culpados quanto a tragédia do Rio de Janeiro e, estando atuando na área de licenciamento ambiental há mais de 10 anos, me sinto no direito e no dever de fazer alguns esclarecimentos.
Se você prestar atenção às imagens que são mostradas na televisão e na internet, se observa claramente que os locais dos desabamentos estavam cobertos por vegetação nativa.
Hoje quando se vai fazer algum licenciamento de loteamento, é exigido um estudo de cota de inundação de cursos d'água que por ventura estejam nas proximidades do empreendimento ou mesmo dentro dele, com período de retorno de 100 anos.
Pois bem, respeitada essa área inundável, se projeta a Área de Preservação Permanente, que tem no mínimo 30 metros segundo a legislação atual.
Essa chuva que ocorreu no Rio tem um período de retorno muito além do imaginável. Talvez mais de 10.000 anos, pois o volume que se percebe que desceu morro abaixo é absurdo.

Portanto, na condição técnico habilitado, posso declarar que essa tragédia foi uma catástrofe natural, como um terremoto.
Ou vão me dizer que terremotos também são causados pelos agricultores.

Marcelo Langer's blog disse...

Desculpa, voce nao assinou seu nome, entao dirijo-me a ti genericamente.
Muito obrigado por seus comentarios e otimos pontos para reflexao.
Tentarei responder a todos eles:
- Nao sou contra os agricultores, nem a nenhum morador, mas precisamos ser tecnicamente eficientes ao analisarmos as causas;
- De fato os morros (encostas e topos de morros)estavam e estao recobertos de vegetação, contudo como ja foi explicado, sao areas geológicas bastante instáveis, por apresentar uma camada de solo muito pequena; também para mim, esta cobertura contribui para o processo de deslizamento, pois a vegetação tem função de absorver a agua da chuva, e como a base da montanha nao foi preservada, o peso excessivo da água, da vegetação e da pequeno superficie de solo para fixacao das raizes acabou contribuindo para o deslizamento.
Mas isso ocorreu, por que como disse, a base (que deve ser sólida para a sustentacao "analogicamente falando" do edificio)foi comprometida pelas ações antrópicas, causando o efeito de corrosão ao solo e a base da montanha. Com a maior incidencia de agua, leitos de rios assoreados, margens desprotegidas, solos susceptíveis a erosão, o cenário se tornou propicio e promoveu a ruptura estrutural dos terrenos.
- Não houve e não há respeito as APP, e por isso que digo que o codigo florestal precisa ser revisto, pois as areas de inundações nao consideradas em 1965, tambem por que os rios estao assoreados e assim o efeito inundação e dispersão das águas será muito maior, e cada vez será maior, se as margens continuarem não sendo preservadas, os leitos dos rios alterados e construções civis edificados nas APPs.
- Em relação a quantidade de chuvas, nao podemos analisa-la isoladamente, como alguns cientistas e a ONU ja afirmaram, devemos somar as ocorrencias naturais (el niño e la niña) as mudanças climáticas oriundas do aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera.
- Em relação terremos, há uma linha de cientistas da ONU e diversas universidades nacionais e internacionais, que assumem a causa natural dos terremotos, devido ao movimento das placas tectonicas, mas somam a isso a exploracao das plataformas marinhas, que vem retirando petroleo e gases, desestabilizando e provando acelerações nas movimentações destas placas.

Repito, nao tenho nada contra os agricultores, muito pelo contrario, mas isso nao significa que posso concordar com uma proposta para um novo código florestal desprovido de conhecimento e bases científicas comprovadas. Principalmente com toda a tecnologia que temos a nosso favor e ciente de que o seu unico propósito é numérico (economico).

Por favor, continue a enviar suas considerações. É exatamente disso que necessitamos, debate, analises, diferentes considerações e pontos de vista.

Porque acima de tudo, precisamos de ferramentas politicas efetivamente eficientes, senao continuaremos neste caminho de destruicao do Planeta.